Nós, Índios

Quando se fala em "índio", 'indígena" tem-se, infelizmente, muitas vezes a impressão de que se está a falar ou ouvir sobre algo primitivo, algo abaixo de nós, de nossa cultura. Evidente que se trata, apenas, de um mero ponto de vista da nossa civilização, em essência europeizada, e que viu o índio não como um humano diferente, mas como um ser inferior, quando nossos ancestrais portugueses aqui desembarcaram.
Mas não é necessário citar uma penca de filósofos e antropólogos que consideram deturpada tal visão. Ora, não podemos, ao menos não da posição que ocupamos, denominar uma cultura como menor que a nossa, ainda mais em se tratando do índio brasileiro. Esse índio que inspirou José de Alencar, Caetano Veloso, Renato Russo, e também Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Drummond. Esse índio que anda por nossas ruas com seus cestos e balaios, tantas vezes humilhados por nosso olhar de desdém são, na verdade, brasileiros do Brasil, por assim dizer, enquanto tantos de nós somos brasileiros que sentem mais orgulho de uma possível, e muitas vezes distante, raiz europeia.
Ah, e quando se fala do indígena, em geral não se fala de seu compromisso humanitário, não baseado em códigos ou doutrinas, como quando, por exemplo, cada adulto de uma aldeia sente-se responsável por toda criança que perto dele se encontra, enquanto nós, que nos julgamos superiores, jogamos na rua filhos que não são nossos.
E depois, existem as críticas de que o índio põe seus filhos para trabalhar e para andar para cima e para baixo, acompanhando os pais na venda de seus balaios e cestos. Ora, o indígena é um ser forte, que se diverte a vida toda! Se nós vemos o trabalho como algo penoso, como um "castigo de Deus", devidamente prescrito no Gênesis, quando assevera que o homem terá que pagar seus pecados com o "suor do seu rosto", o indígena vê o trabalho como um fruto que é necessário aprender a cultivar desde cedo, pois uma árvore já contém na semente todo o seu destino, e não se torna árvore apenas quando está enorme, com galhos a ofertar sombra. Assim, como uma árvore, desde a semente o indígena é um ser integral, forte, seguro de seu destino de luta e resistência. Enquanto nós, brancos, civilizados, nos queixamos da vida, mudando a cada instante de canal na TV.


 

Maygon Molinari, Dayane Filipak, João Henrique de Souza


Publicado na edição 654, 16 de janeiro de 2013.