Fim de ano

Fim de ano é como diz o nome, fim de ano. Ás vezes fico pasmo com o brilhantismo das minhas constatações. Os últimos dos 365 dias do calendário que nos impuseram, vêm sempre recheados de festas & folguedos & votos de que o próximo ano seja melhor do que o que passou. Não acredito muito nesses votos de felizes augúrios de pelo menos uns 75% dos que vem me desejar isso, e não sei porque. Acho que deveria ser mais hipócrita e fazer de conta que acredito no que me dizem e, participando da hipocrisia, fazer de conta que também são honestos os meus votos. Mas pra mim é complicado, sou mau ator e me ferro na primeira tentativa. Não sou um ser social como regem os princípios da boa convivência e tapinha nas costas decididamente não consta do meu cardápio. E por falar em cardápio lembro de ter dito durante o ano – constatação vazia, leviandade minha, claro – que nem todo grande cozinheiro é um puxa-saco, mas todo puxa-saco é, no mínimo, um bom cozinheiro, faz parte do perfil. Mas nem sei por que tô tratando disso, afinal o clima é de festa. Por falar em festa (uma coisa puxa a outra) vou pegar uma briga com o Helio Salmon, mas ele vai entender a minha posição. Dá-se o seguinte: de todas as pessoas que conheço – inclusive as que não conheço, mas aparecem como chefes de fãs-clubes e outras amenidades – é maior admirador do Roberto Carlos. Tava eu mais perdido que cego em tiroteio e sem ter pra onde correr, resolvo ver o show do cantor via Globo. Alguma coisa me dizia que eu não deveria arriscar tal empreitada mas, esnucado, fui em frente. E o temor não demorou muito a se materializar. Já, aos primeiros acordes da magnífica banda do Eduardo Lages, senti que a vaca tinha ido pro brejo. Apesar da trajetória do Roberto Carlos, em termos de marketing, ser uma das, ou a mais, profissional do país, não tem mais jeito. O “script” tá gasto, exaurido, o repertório é o mesmo sempre; não existe mais nem como se fazer um arranjo novo pras velhas canções, não cabe, não coaduna, não fecha. Antigamente ainda se apelava para outros seres ancestrais com uma história parecida com a do astro principal. Hoje foram substituídos por promessas cantantes, duplas sertanejas e escolas de samba compondo uma salada de péssimo gosto, difícil de digerir. Uma vez eu conversava com o Carlinhos Lyra, um dos criadores da Bossa Nova e compositor de belas canções como “Minha Namorada” (pra citar só uma, são dezenas) e disse-lhe que estranhava o seu afastamento de palcos e gravadoras e ele respondeu: “Depois de Minha Namorada, não fiz nada melhor, então o que se pode fazer é parar”. Descupaí Hélio, mas tá lembrado da minha passagem pela frente daquela loja? Pois é.

Caras e caros, incautos ou não, que comparecem a este espaço, quero lhes dizer que o ano que vem tem mais - pelo menos espero né – enquanto isso façam alguma coisa pra que o próximo ano de vocês seja bom. Não entrem nessa de que tudo vai ser diferente porque muda o calendário, o bicho vai continuar pegando. Em todo caso, e pra ser solidário, Feliz Ano Novo.

Marco Leite

Publicado na edição 551, em 29 de dezembro de 2010