Doação de órgãos, um ato que pode salvar vidas

Desde 2009, a Santa Casa realiza a captação de córneas em Irati, o que tem colaborado para a redução da fila de espera por este tipo de transplante no Paraná


Em seis anos, a doação de órgãos no Brasil cresceu cerca de 90%, segundo dados do Ministério da Saúde. Em 2008, o número de doadores era de 1.350. Já em 2013, o número passou para 2.562. O Paraná ocupa a 4ª posição no ranking de órgãos transplantados no país, com um total de 336 transplantes nos primeiros três meses de 2014.

Da esquerda para a direita: a psicóloga Eliza Gontarz,
a assistente social Ana Cláudia de Andrade
e a psicóloga Stephanie Sonsin Oliveira
@ Kyene Becker/Hoje Centro Sul
Apesar disso, mais de 2 mil pessoas ainda estão na fila de espera por um órgão no Estado. Para tentar mudar esse cenário, a Santa Casa de Misericórdia de Irati promove uma campanha de conscientização às famílias, em alusão ao Dia Nacional de Doação de Órgãos,  comemorado no dia 27 de setembro. Desde 2009, o hospital realiza a captação de córneas no município, porém, a aceitação das famílias ainda é baixa.

Segundo a psicóloga Eliza Gontarz, a decisão pela doação da córnea é responsabilidade da família. Ela explica que uma equipe de profissionais da Santa Casa entra em contato com familiares do paciente. “São três pessoas que fazem a abordagem à família, duas psicólogas e uma assistente social. Após constatar o óbito, nós conversamos e perguntamos se há o interesse em fazer a doação. Se a resposta for positiva, existem três enfermeiras, que são colaboradoras, que irão realizar a retirada da córnea. Nós temos uma escala, pois trabalhamos 24h com essa equipe”.

Eliza ressalta que a vontade em ser doador deve ser expressa ainda em vida, pois a declaração que antes existia na carteira de motorista não tem mais validade. “Essa lei não existe mais. Antigamente, se você queria ser doador de órgãos, você comunicava na carteira de motorista. Hoje, isso não vale mais. Então, a campanha de doação é direcionada à família. Você deve falar em vida, para que quando aconteça, sua família saiba do seu desejo em ser doador. É a família que dá ou não a autorização”, diz.

A assistente social Ana Cláudia de Andrade conta que para ser doador, a pessoa precisa atender alguns critérios. “Os critérios são inúmeros, mas os principais são: ter idade entre 10 e 65 anos e a causa da morte tem que ser conhecida, geralmente são mortes súbitas, como infarto ou acidente”, afirma. Ela destaca que a abordagem às famílias é realizada apenas após a confirmação do óbito, ou seja, após o coração parar de bater.

Ana Cláudia ainda ressalta que das 50 abordagens realizadas até o momento, 30 doações foram autorizadas. Porém, ela explica que o número poderia ser maior. “No ano passado, o Paraná teve mais de 8 mil potenciais doadores, mas apenas 4 mil doaram. A metade foi por recusa da família. Fica evidente a falta de informação e conhecimento de muitos. Tem famílias que nos dizem que nunca ouviram falar de doação de órgãos”.

A psicóloga Eliza Gontarz destaca que todas as córneas enviadas pela Santa Casa já foram transplantadas. “Antes, nós tínhamos uma média de 70 a 80 pessoas na fila do Paraná. Hoje, essa média é de 60 a 70 pessoas. Irati tem colaborado muito para a redução desse fila de espera. A cada doação duas pessoas são beneficiadas na fila. Um doador pra dois receptores. Se a pessoa tem um problema nos dois olhos, ela recebe uma córnea e depois volta para o final da fila, esperando a outra”, completa.

A psicóloga ainda explica que o processo para a captação do órgão não pode ultrapassar 6 horas. “Em média, nós temos 6 horas para fazer a retirada do órgão pós-óbito. Por isso, é algo que tem que ser muito rápido. Se você já tiver conversado com sua família e, por um acaso, vir a óbito, todo esse processo é mais simples, a aceitação é mais fácil. Nós estamos falando em mais duas vidas que serão beneficiadas por esse transplante”. Ela explica que todo o processo de retirada do órgão leva em torno de 1 hora e não prejudica nenhum trâmite ou ritual da família.

Eliza conta que a doação também pode acontecer quando há morte cerebral, porém, nesses casos, a aceitação da família é menor. “A maior dificuldade é quando a pessoa tem morte cerebral. É mais difícil para a família compreender, porque ela está vendo a pessoa respirando, o coração batendo. A família pensa que, ao doar os órgãos nessas condições, vai matar a pessoa. Ela não consegue entender que quando o cérebro morre significa morte, é irreversível”. Ela destaca que a Santa Casa de Irati ainda não possui um médico neurologista, o que inviabiliza que outros órgãos sejam doados. “Nós ainda não temos a presença de um neurologista aqui e nem uma estrutura para realizar a captação de outros órgãos. A partir do momento que o quadro estiver fechado, será mais fácil tentarmos fazer isso, pois a constatação da morte cerebral envolve muitos pontos”, completa.

Conscientização

A psicóloga Stephanie Sonsin Oliveira enfatiza que todas as pessoas que tiverem interesse em serem doadores, devem expressar isso para as famílias. “Quando a família não aceita fazer a doação, normalmente o paciente que veio a óbito não expressou que gostaria de ser doador ou expressou que não gostaria. Por isso, é muito importante que a pessoa comunique isso pra família. Alguns familiares não se interessam, porque justamente a pessoa nunca demonstrou vontade em ser doador”, afirma.
Stephanie explica que a conscientização, nesse caso, é de extrema importância. “Às vezes, nós doamos muitas coisas, como por exemplo, o tempo e roupas. Muitas vezes, poderíamos também falar da doação de órgãos, que é algo muito importante, porque, infelizmente, é um órgão que não será mais utilizado pela pessoa que veio a óbito. Mas as pessoas devem se conscientizar que é um órgão que pode salvar outras vidas”. Segundo ela, a família também deve respeitar a decisão do doador. “As pessoas devem aproveitar as oportunidades para conversarem com suas famílias. Elas devem falar sobre isso, expressar claramente essa vontade. A família também deve respeitar essa decisão”, finaliza.

Por Kyene Becker/ Hoje Centro Sul