Ginastas de Irati sonham em participar da seleção brasileira

Dedicação e muito esforço fazem parte do dia-a-dia  das 133 meninas da Escola de Talentos – Ginástica Artística Feminina



Mãos calejadas, determinação e muito treino, é esse o cotidiano das atletas que praticam a ginástica artística.

Popularizado através dos talentos de Jade Barbosa e Daiane dos Santos, o esporte cativa pela beleza e complexidade dos movimentos.


O projeto Escola de Talentos – Ginástica Artística Feminina, fomentado pelo Governo do Estado, Federação Paranaense de Ginástica (FPRG) e patrocinadores, seleciona meninas dos cinco aos doze anos para treinarem na seleção brasileira de ginástica artística. Sete municípios do Paraná foram contemplados com o projeto, dentre eles, Irati. Para os municípios, equipamentos de porte infantil no valor de R$ 100 mil foram doados, além dos uniformes de treino e colãs usados nas apresentações, ficando a cargo das prefeituras municipais a contratação de profissionais de Educação Física para ministrar os treinamentos.

As professoras Alcione Marafon e Luciana Camargo Schroeder estão à frente do projeto em Irati. “O intuito do projeto é alto rendimento, porque o objetivo da FPRG é que uma ou duas ginastas possam sair daqui pra treinar em Curitiba, pra poder participar da seleção brasileira”, comenta Alcione. Em Telêmaco Borba o projeto já levou uma atleta para a seleção, que está treinando no juvenil.
A Escola de Talentos em Irati conta com a participação de aproximadamente 133 garotas. A seleção é feita no início do ano, quando as professoras passam nas escolas convidando as meninas para um teste. Segundo Luciana Schroeder a seleção já começa aí, onde elas escolhem preferencialmente as mais magras e baixas, que em seguida participarão de testes de força e resistência. O motivo é o alto rendimento exigido pelo projeto. “Pra você conseguir encontrar uma Daiane dos Santos, uma Jade Barbosa, é uma entre quantas dentro do projeto”, sugere a professora. E há também um limite de idade, podendo permanecer nos treinamentos meninas de até doze anos.
Luciana ainda explica que não é um programa de inclusão social. As mais gordinhas, ou muito altas, por exemplo, não conseguiriam executar os movimentos, o que poderia levá-las também à frustração diante das outras garotas.

A alimentação é rigorosa, contanto, o controle não é exagerado. Luciana Schroeder comenta que recomenda o básico: arroz, feijão, salada e carne. Contudo, são expressamente proibidos refrigerantes e doces, para que não saiam do peso, nem percam força. As meninas são pesadas uma vez por semana. “A partir do momento que você está praticando esporte, está tendo desgaste físico, se você não colocar o combustível certo, não colocar o alimento certo, uma hora vai baixar a imunidade, alguma coisa vai acontecer, um risco de lesão, ou qualquer outra coisa,” comenta Luciana.
Treinamento rígido

As alunas são dividas em turmas de 15, treinando duas vezes por semana cada. O foco, segundo as professoras, são as mais novas, de cinco anos. “É muito fácil corrigir a postura delas, mas saiu de cima delas elas já saem da postura”, explica a professora Alcione. Mas não faltam oportunidades também de cativá-las. “O fato de elas estarem lá, fazendo uma barrinha, virando salto na cama elástica, fazendo uma coisa de bailarina, elas adoram,” observa Alcione.
Alguns pais não entendem no início a rigidez do treinamento. As professoras então orientam, lembrando-os o objetivo do projeto, que é ingressar na seleção brasileira de ginástica artística. O Centro de treinamento de Curitiba é o melhor do país, onde as garotas terão a oportunidade de treinar se mantiverem o foco, e quem sabe, representar o Brasil em uma olimpíada. Professores da Federação Paranaense de Ginástica Artística fazem visitas periódicas aos oito municípios contemplados com o projeto, observando se as aulas estão corretas e o nível das alunas. Para manter o projeto na cidade é preciso cumprir metas, e só através de muito esforço e dedicação isso é possível. Fora isso há ainda competições entre os pólos – como Copa de Estreante, Festival de Estreantes e Campeonato de Duplas, entre outros – nas quais são feitas atividades e avaliadas as atletas individualmente e em grupo.

Bons exemplos
Uma maneira que as professoras Alcione e Luciana encontraram para cativar as meninas, e ajudá-las a suportar o ritmo dos treinos, é incentivar a verem vídeos no youtube de ginastas famosas. Segundo as professoras, isso mexe com a imaginação das alunas, e as estimula a buscarem o sonho, de, por exemplo, um dia, executarem um salto Duplo Carpado Twist, como o de Daiane dos Santos.
A ginástica artística busca a excelência dos movimentos. Segundo Luciana, os saltos e giros são acréscimos da dança, mas representam a ginástica pura, a prática e a perfeição dos movimentos. Expressões faciais e corporais também fazem parte da ginástica. Para isso, é preciso total concentração, foco, muita técnica e treino. A prática continuada é que, segundo Luciana, eleva o grau dos movimentos ao artístico. E essa disciplina reverbera no dia-a-dia das alunas, aumentando o rendimento escolar e a concentração.

Centro de treinamento
Uma dificuldade do projeto em Irati é o centro de treinamento. As professoras estão lutando para conseguir um centro exclusivo, pois, atualmente, as aulas são ministradas no pavilhão do Parque Aquático, onde o chão não é forrado, e apresenta problemas de temperatura, sendo muito quente no verão e muito frio no inverno. Para as pequeninas isso é um problema. Além de terem que montar e desmontar os equipamentos, o que acaba desgastando-os. “Quando se trabalha um esporte de alto rendimento, elas precisam ter um foco, e quando estamos dentro de um lugar dividindo com outras pessoas, fica difícil”, explica Luciana.

Talento
Prova de que o esporte muda para melhor o cotidiano das atletas, é Valkiria Letícia Semczyczem, de onze anos.
Valkíria frequenta o projeto desde o início. Já havia feito balé, ginástica, e acompanhava seu tio nas aulas de fitness.
Durante o período de aulas, a menina acorda às 6h30 pra ir pra escola, e, após o almoço, vai praticar a ginástica, nas aulas ou em casa. Por causa da idade, Valkíria está treinando no projeto apenas dois dias da semana. Mas queria mais. “Esse ano vou pedir a professora pra voltar a fazer três dias.” Mesmo afirmando que fica bastante cansada, a garota não acha rigoroso o treinamento, e completa que se não for assim, não rende. “Eu acho que o certo é as professoras serem mais rigorosas, levarem ao limite.”

A mãe, Ângela Valquíria Semczyczem, concorda que o esporte mudou a maneira de ser de Valkíria, tanto em casa, na família, como na escola, e na alimentação. “Antigamente era refrigerante, salgadinho, doce o dia inteiro.” Segundo ela, a ginástica foi oferecida à filha apenas como uma maneira de se ocupar, mas aí a filha tomou gosto pelo esporte.
Ela já se apresentou em Curitiba no Festival de Estreantes, uma série, que são movimentos executados no ritmo de uma música, em solo, onde foi medalhista.
A determinação da ginasta vai além. Quando o restaurante dos pais está fechado, é lá que ela treina. Quando está cuidando da irmã de 3 anos em casa, também treina. “O vô fica louco dizendo que não é pra fazer, que eu vou quebrar tudo,” confessa Valkíria. E a mãe, concorda: “ela bate nas cadeiras, bate em tudo o que tem pela frente, é pé nas paredes, em tudo quanto é canto, derruba quadro…”
Por influência do esporte e das professoras, a menina quer se formar em Educação Física. Mas, admite outra opção. “Se eu pudesse também eu ia me formar em fisioterapia, pra ser ecoterapeuta,” afirma.

Perguntado se Valkria tivesse que parar com os treinos, por causa do limite de idade do projeto, a menina responde: “ah, eu não sei, acho que tem alguma academia que tem ginástica aqui em Irati, eu ia pedir pra minha mãe me pôr.”
E, assim, Valkiria Semczyczem dá seu exemplo de coragem, e deixa claro seu apego pelo esporte. “Ginástica é tudo, porque ela me incentivou muito, me mudou totalmente.”

Texto: Kaio Ribeiro
Fotos: Arquivo Valkiria Semczyczem