Rebouças será referência nacional em Cuidados Continuados

Há oito anos, Joel Candeo dos Santos sofreu um acidente de moto numa via rural no município de Rebouças enquanto voltava da lavoura. O choque frontal com um veículo em alta velocidade fraturou seu fêmur em duas partes. Após passar pelo processo cirúrgico, Santos recebeu a notícia que a fratura não se calcificou como deveria e, sem a colocação de uma prótese, ele não poderia mais firmar a perna lesionada no chão. Recebido alta do hospital, Santos voltou para sua rotina – agora aposentado por invalidez. “Não poder mais trabalhar foi o mais difícil do processo. Mexi com lavouras a minha vida toda e, de uma hora para outra, fui ‘obrigado’ a parar”, conta. Sem condições de adquirir uma prótese e procurar um atendimento especializado, Santos encontrou conforto e apoio moral em Deus e nos mais próximos. “Se não fosse a fé e essas pessoas, tudo seria muito mais difícil”.

O secretário estadual da Saúde, Michele Caputo Neto, participa do lançamento oficial do projeto Cuidados Continuados Integrados no Paraná. Irati, 17/07/2013. Foto: Venilton Kuchler/Secretaria da SaúdeCuidados Continuados
Casos como o de Santos se repetem por todo o país. São mais de 13 mil deficientes motores de acordo com o Censo 2010 do Instituto Brasileiro Geografia e Estatística (IBGE). Dentre tantos, os que se acidentaram, na maioria das vezes, recebem alta no hospital e regressam para suas casas sem auxílio psicológico ou fisioterápico. Além disso, o número de pessoas com mais de 60 anos cresce exponencialmente – parcela da sociedade na qual quedas e fraturas são comuns. Pensando nisso, a Secretaria Estadual de Saúde (SESA) estruturou – em parceria com o Ministério da Saúde – o projeto Cuidados Continuados Integrados no Paraná. O intuito é criar uma unidade hospitalar capaz de dar um suporte especializado para pessoas que receberam alta no hospital, mas não têm condições psicossociais de voltar para casa – por algum tipo de dependência funcional ou falta de autonomia. O município de Rebouças será a cidade contemplada com a unidade. Esta ação é pioneira no país e acontece simultaneamente a outras três – em Cuiabá (MT), Franca (SP) e Teresina (PI). O projeto iniciou-se oficialmente na última quarta-feira (17) em Irati.
A ideia surgiu com pessoas envolvidas  num projeto da  Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo que buscava melhorias na gestão de hospitais filantrópicos do estado de São Paulo. Segundo o professor do departamento de Medicina Social da faculdade e 681_med3coordenador do projeto, Paulo Carrara de Castro, durante a pesquisa foi observado que muitos dos hospitais ofereciam serviços que não estavam adequados à demanda da população. “Desenvolvemos esse projeto para suprir essa demanda e, ao mesmo tempo, desafogar os hospitais dos grandes centros – equilibrando a quantidade de internações com hospitais subutilizados nos municípios do interior”, diz. Atualmente, dos 412 hospitais existentes no Paraná, 293 tem menos de 50 leitos. Geralmente, eles são responsáveis por atendimentos básicos que poderiam ser resolvidos em unidades da saúde da família. Além disso, muitos enfrentam problemas financeiros, devido à baixa ocupação dos leitos e a baixa complexidade dos serviços oferecidos.
Para suprir a defasagem de conhecimentos técnicos no país, a organização do projeto estruturou seminários e palestras sobre o tema com profissionais de diversos países, especializados no assunto. O superintendente de Gestão de Sistemas de Saúde, Paulo Almeida, afirma que as referências foram buscadas na Espanha e Portugal. “Nós trouxemos esses profissionais justamente para mudar o modelo de atenção aplicado para certos tipos de pacientes. Hoje, o que nos preocupa são as condições crônicas – que predominam no paciente idoso – e esses palestrantes possuem experiências que vem para agregar informações para o projeto”, afirma.

Uma nova vocação
Segundo  o  secretário  estadual de Saúde, Michele Caputo Neto, uma das propostas do projeto é estabelecer uma nova vocação para esses hospitais, tornando-os centros especializados em atendimento às condições crônicas. “Esta será a solução para resgatarmos estes hospitais. Sabemos que eles podem cumprir um papel importante na rede integral de cuidados que estamos construindo no Estado”, disse. Hoje, as doenças crônicas são a principal causa de internamento em hospitais e isso se deve principalmente ao 681_med2envelhecimento da população. Cerca de 11% da população paranaense tem mais de 60 anos e necessita de acompanhamento constante e perto de casa. “A nossa população está envelhecendo e nós não temos profissionais suficientemente capacitados para lidar com esse crescimento de idosos no país. Para tanto, a preparação desses profissionais é necessária para que o projeto corra como programado”, completa João Antônio de Almeida Junior, diretor da 4ª Regional de Saúde.

Como funciona
Na prática, a assistência hospitalar na nova unidade funcionará da seguinte forma: ao ser encaminhado, o paciente terá acesso a profissionais especializados em diversas áreas (fisioterapia, nutrição, terapia ocupacional, psicologia etc) para que seu físico e seu psicológico estejam aptos para retornar à rotina. “Nós não vamos dar ‘alta’ para o paciente e, sim, um acompanhamento gradativo de acordo com a recuperação da pessoa”, afirma Junior. A proposta não é tornar a unidade um local de asilamento ou internação permanente, mas recuperar esses pacientes, segundo o diretor. “A pessoa entra, se recupera e retorna para a casa”, completa.
Além  de  profissionais ca-pacitados para o serviço, a unidade trabalhará com assistentes sociais, os quais farão o reconhecimento e o registro dos pacientes e suas condições socioeconômicas. O assistente fará um levantamento de dados a fim de traçar um planejamento do tratamento para o paciente em questão. Porém, a unidade será referenciada – ou seja, será interligada com outros hospitais de toda a região. “Todos os hospitais de referência na nossa região serão contemplados”, afirma Junior. O atendimento será todo pelo Sistema Único de Saúde – custeado pelo poder público. Os outros financiamentos relacionados à construção da unidade ficam por encargo do setor social do Hospital Samaritano, de São Paulo.
De acordo com Santos, uma unidade em seu município é um avanço. “Seu eu tivesse acesso a um local como este, com certeza a readaptação seria mais tranquila”, afirma. Quanto a isso, o professor Castro é objetivo. “Os cidadãos brasileiros precisam disso. Por tanto, precisamos nos preparar para o que eles precisam”, completa.

Texto: Lucas Waricoda, com informações de assessoria/Fotos: Sérgio Popo